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A palavra que mais define os últimos dias é confusão 

Já não me sinto nem me encontro

Perdida em meio a uma bagunça 

Uma grande bagunça, o caos interior

Tá difícil de verbalizar tudo isso

Talvez não seja necessário

Meu desejo é que se vá, me deixe 

Ou melhor que eu retorne 

Talvez eu nunca tenha sido algo

Mas uma folha vazia vale mais que rabiscos

O que me deixa aflita nesse completo descontrole?

Não ter o controle ou saber que nunca tive? 

Me afogando cada vez mais dentro de mim

Tendo uma descarga elétrica, um curto-circuito, uma explosão na cabeça 

O coração acelerado, descompassado, tão apertado que chega a doer

E a pior de todas essas sensações é a de proximidade com a morte ou falta de vida

Sufocamento, afogamento ou o tal do enlouquecimento 

É sim como morrer, de diferentes modos e em diferentes lugares sem ter como parar

O mais complexo nisso é a incomplexão 

Meus sentimentos estão em colapso

Minha energia sugada e meu humor oscila constantemente 

Rezo pelo equilíbrio que se quer um dia tive 

Aquele que sempre ansiei ter, me parece algo divino

Talvez precise pisar no inferno pra encontrar meu céu 

E tudo isso se torne passado

Apenas uma lembrança ruim


                                                                                     Julie Silveira

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